A Paixão de Cristo
Segundo o cirurgião CAPÍTULO 25

NO CADAVER. EXPERIENCIAS

Resultado de imagem para CORAÇÃO DE CRISTO CHAGAS

 O sangue. - Em uma série de corpos para autópsia, executei
várias experiências. Tomei, primeiro, uma agulha comprida
adaptada em uma grande seringa. Localizei o nível da chaga, enterrei
ràpidamente a agulha no 5.0 espaço intercostal direito sem
cessar de aspirar, apontando sempre para dentro e para o 􀖚to
e um pouco para trás. Entre os 9 e 10 em, penetrei na auricula
direita e, como continuava . a aspirar, enchi a seringa de sangue
liquido. Enquanto atravessava o pulmão, a aspiração continua não
trouxe líquido algum, nem sangue, nem água.
Enterrei, em seguida nas mesmas condições uma grande faca
de amputação. Na mesma profundidade, abriú a aurícula direita e
o sangue escorreu ao longo da lâmina, através do túnel perfurado
no pulmão.
Tôdas estas experiências foram seguidas, evidentemente, de
dissecação e feitas em cadáveres de mais de 24 horas de acórdo
com o regulamento das autópsias.
b) A água. - O sangue vem portanto, naturalmente, do coração
e, em tal quantidade, não poderia vir senão dali. Mas, donde
veio a água?
Já notara nas minhas primeiras autópsias que o pericárdio
continha sempre uma quantidade de serosidade (hidropericárdio)
suficiente para que se o visse escorrer pela incisão da fôlha
parietal. Em certos casos chegava a ser mesmo muito abundante.
Tornei a tomar minha seringa e empurrei a agulha muito lentamente,
ao mesmo tempo que ia aspirando, sem interrupção.
Assim, senti a resistência do pericárdio fibroso e, logo depois de
tê-lo perfurado, aspirei notável quantidade de serosidade. Depois,
prosseguindo a agulha seu caminho, aspirei sangue da aurícula
direita.
Em seguida retomei a faca de amputação e enterrando-a com
as mesmas precauções vi primeiro correr a serosidade, depois,
empurrando mais para adiante, o sangue.
Por fim, se se enterra brutalmente esta faca, vê-se sair da
chaga considerável fluxo de sangue; mas pode-se distinguir, sôbre
seus bordos, que escorre também uma quantidade menos Importante
de serosidade pericárdica.
Era, portanto, a ágna, líquido pericárdico. Pode-se supor que
após aquela agonia excepcionalmente penosa, que foi a do Salvador,
êste hidropericárdio fôsse particularmente abundante 1 e suficiente
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para que São João, testemunha ocular, tivesse podido ver claramente
correr sangue e água. Para êle a serosidade, não podia
ser senão água, da qual tem tôda a aparência. Como no corpo
não há outra espécie de água a não ser serosidade, não pode ser
água pura. Aliás, nós mesmos a chamamos de "hidropericárdio"
que quer dizer "água contida no pericárdio".
Estas experiências sôbre o coração foram retomadas, em 1937,
pelo Dr. Judica, então livre-docente de anatomia patológica na
Faculdade de Milão ; depois que leu êle a primeira edição de meu
folheto "Cinq Plaies" (janeiro de 1 93 5 ) . Lembro que meu artigo
inicial apareceu no "Bulletin de Saint-Luc" de março de 1 934,
tendo feito minhas experiências em 1932-1933 .
Meu amigo Judica, em seu artigo, na "Medicina Italiana,.
(Milão, 193 7 ) , confirma plenamente os resultados de minhas experiências,
com os quais coincidem os das suas. Também segundo
s􀋫u parecer, o sangue vem da aurícula direita e a água do pericárdio
; confirmação feita com inteira isenção de ânimo, pois
ainda não nos conhecíamos, naquela época, e tanto mais preciosa
para mim por proceder de um anatomopatologista de carreira.
Diferimos, no entanto, um pouco, quanto à origem dêste hidropericárdio.
Emitira eu a hipótese de hidropericárdio proveniente
da agonia. Mas, confesso que sem nenhuma vaidade de autor, não
considero essencial esta explicação patogênica se a experiência
chegar a demonstrar que a de Judica é exata.
Para êle trata-se de "pericardite serosa traumática". Esta perical
·dite fóra provocada pelos golpes, pauladas e sobretudo pela
flagelação atroz sofrida pelo torax, no pretório. Tais violências
poderiam bem provocar uma pericardite que, após estádio mui
curto de hiperemia, não excedendo, muitas vêzes, senão algumas
horas, produz um derramamento seroso rápido e abundante.
Um médico bem pode imaginar os graves incômodos que deve
ter ocasionado tal lesão ; dôres precordiais dilacerantes, opressão,
augústia, calafrios, febre e por fim dispnéia intensa que sobrt:vem
à asfixia por tetania dos músculos inspiradores. Assim se explicaria
sua extrema fraqueza na subida do Calvário. Não pôde
nem sequer carregar a cruz, ainda que reduzida só ao patíbulo,
nos 600 m que separam o pretório do Gólgota, e foi preciso que
Simão O substituísse. Assim se explicam também, em parte, Suas
quedas no caminho para o Calvário.
De qualquer maneira, trata-se de hidropericárdio e Judica
nisto está inteiramente de acôrdo comigo. O restante de sua hipó­
tese me parece cada vez mais verossímil.
c) A hemorragia transversal posterior. - Eis pois explicada,
com grandes probabilidades de exatidão, a origem do sangue
e da água, mas não é tudo. Vê-se na imagem dorsal do Santo
Sudário um importante rêgo transversal, bem na base do torax,
que é por êle completamente obstruido, bastante largo no bordo
direito, dividindo-se em vários regos até atingir o bordo esquerdo
do tronco. tste rêgo tem por origem um fluxo de sangue, porque
verifiquei sua côr especial, tingida de vermelho, no Sudário visto
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em pleno dia. De onde veio êste sangue e por que correu assim
transversalmente? A anatomia nô-lo explicará ainda (fig. 1 7 ) .
No momento d o lançaço, o cadáver, pregado à cruz estava
em posição vertical. A aurícula direita pôde se esvasiar e, parcialmente,
também a veia cava superior que lhe está por cima, com
seus a.ferentes, veias da cabeça e dos braços. O fluxo correu verticalmente
pelo torax anterior, sob a chaga. Mas a veia cava
inferior, subjacente, ficou cheia. É comprida e larga, e sabemos
que ao cortá-la numa autópsia, provocamos logo uma verdadeira
inundação de sangue no ventre.
Ora, na volta de José de Arimatéia, despregaram os pés,
desengancharam o patíbulo da haste vertical e transportaram o
patíbulo com o corpo ; horizontalmente, até o túmulo. O sangue
da veia cava inferior pôde então refluir até a auricula direita e
escorrer para fora pela chaga do lado que continuava aberta. Mas
estando agora o cadáver em posição horizontal, esta nova hemorragia
escorreu pelo lado direito, e continuou a correr transversalmente
na face posterior, obstruindo a parte inferior do torax. Ainda
voltaremos a isto para examinar os detalhes desta imagem quando
tratarmos do transporte (capítulo VIII ) . Mas deu-se aqui um fato
novo, após minhas primeiras edições, cujas conseqüências exporei
no número 5 .0 do presente capítulo (pág. 124).

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